sábado, 24 de abril de 2010

Impressões sobre um Segredo Sincero








*Como se eu tivesse quarenta anos, fui sozinha deliciar-me ouvindo Leila Pinheiro (uma das coisas da minha infância). Amei.


** Cuidado: Esse blog
não é sobre técnica, portanto, isso não é uma resenha: trata-se das sensações de uma proscrita.

***Agora, compartilho com vocês:


MEMÓRIA



Infância tem aquele cheiro de plástico das miniaturas das personagens de desenho animado com diversos instrumentos musicais enfileirados sobre o tampo de vidro da mesa de centro – a minha banda... ou o primeiro sonho. Tem cheiro da madeira do violão do meu tio, domingo de tarde, tocando “Teatro de vampiros” e “Metal contra as nuvens”, pra mim. Tem cheiro de terra remexida e de grama no quintal, lá fora, sendo arrancada por meu irmão cantando Legião Urbana com sua voz igualmente grave, entrando pela janela. Tem o cheiro das lágrimas do mesmo irmão derramadas pela morte do seu ídolo máximo: Renato Russo. Tem cheiro de "Catavento e Girassol". E de muito mais que isso.

* * *

Quando, às 20h12 tocou o terceiro sinal grave, duro e áspero como a sensação da pele rasgando no asfalto, eu tremia e, sem perceber, uma nuvem mais sólida que eu imaginava, emergiu. Nessa bruma eu me vi aos seis ou sete anos, na sala de casa, cantando junto com o aparelho de CD a última canção de "Verde, Anil, Cor-de-rosa, Carvão", desligando-o (o tão querido!) e trocando pelo "Catavento e o Girassol" pra sentir cada gota de feeling escoar pela melodia bossa-nova, das letras irreverentes cujo teor não entendia completamente - e nem poderia. Quando mamãe comprou o “Catavento”, ouviu e não gostou, guardou na estante "tenho, mas não ouço" e eu tirei de lá porque aquilo havia, de algum modo, me tocado.

Prossigamos.




LEILA U LEGIÃO


Comprei o ingresso cegamente sem saber qual era o show

(importante era ser Leila Pinheiro), mas descobri dias antes que seria uma homenagem ao Renato Russo. Em Brasília?Em Brasília. Ótimo.

Quandopercebi que seria uma cantora de MPB interpretando clássicos do rock oitentista, da Legião, suspirei um tanto desesperançosa. O conceito pré foi de que seria uma atmosfera azul, com ritmo gotejante que impediria o público sedento por acompanhar as canções conhecidas; que seria algo para a artista - e apenas ela - se deleitar. Esse conceito vem de longa data, porque se repetiram váaarias vezes, nos meus vinte anos. O primeiro detalhe do “Meu Segredo Mais Sincero” da cantora, compositora e instrumentista Leila Pinheiro é a sua inovação nesse quesito: com os diferentes arranjos de Claudio Faria, cada canção torna-se outra, e, ao mesmo tempo, permanece reconhecível, encorpada; cada palavra proferida com a forte essência nos trejeitos de Leila transborda sensações. Imensas sensações, imensas.


MEU SEGREDO MAIS SINCERO


Finalmente, apagaram as luzes da platéia. Claudio Faria (teclados, violão e voz), Maurício Oliveira (Contrabaixo e voz), Allen Pontes (Bateria) e Webster Santos (Guitarra e violão) entraram no palco nevoento sob a iluminação azulada e então começou a projeção difusa, em preto e branco, ao som de Renato Russo. Súbito arrepio. E, numa explosão de expectativas, a cantora entra, e começa “Ainda é cedo”. Era difícil não cantar junto, não mover o corpo acompanhando aquelas imagens, a vibração cúmplice entre o público a cantora, sua banda e aquelas canções tão significativas.

Quando começaram os acordes de “Há tempos”, era impossível acreditar naquela bela interpretação que unia um aparência particular groove/blues/bossa-nova e um clássico numa química apaixonante, agora, banhada em luz laranja e azul.

Índios”, “Teatro de Vampiros” e “Geração Coca-Cola”, lambidas em luz amarela, laranja e azul ondulante, foram o início da visão plena da cumplicidade do público cujo mar de sussurros se fazia ouvir como um cantar. Nessas cações, Leila pareceu tão íntima daquelas palavras, como se houvesse bebido letra a letra com imenso prazer. “Geração Coca-Cola”, na minha memória era a época em que ganhei o primeiro violão e tocava Legião numa rodinha e ensaiava com outras melodias e letras punk criadas por nós, três garotas “legionárias”. Mais ou menos na mesma época, chegaram até mim um exemplar do primeiro vinil lançado pela Legião autografado pelos Renatos (Russo e Rocha) e o vinil “Dois” (meus tesouros).

Mais uma vez, a introdução da música despertou minha curiosidade, mas a então veio Pinheiro modulando com uma pitada de aridez e a guitarra despejou “Daniel na Cova dos Leões”. Tão logo a época em que lemos “Renato Russo de A a Z” e descobrimos o que era o “gosto amargo no corpo”descrito na composição. E descobrimos muitas coisas mais. E fomos crescendo, crescendo e desenvolvendo.

Quando a próxima canção começou veio aquele arrepio: um enérgico e emocionante dueto com Renato Russo em italiano “La Solitude”. Mais tarde, vem a animadíssima “Cherish”, o dançante cover de Madonna.

Outro destaque foi a versão de bossa-nova para “Eduardo e Monica”. Nela, Leila (que dá o ritmo com violão) e Maurício (que salpica uma levada groove), dividem os vocais, como as personagens da música numa suavidade apaixonante.

Em vários momentos como “Pais e filhos”, “Hoje” e “Mais uma vez” alguns componentes da banda saem e cria-se um foco sonoro, muitas vezes com a intérprete assumindo o piano ou teclado, digitando cada acorde num visível êxtase.

Que país é esse”, “Tempo perdido” e “Será” fizeram todos cantarem com força, em uníssono, e, no fim, aplaudirem de pé, clamando pelo “bis”. Ora, voltaram e tocaram novamente “Geração Coca-cola” e “Há tempos”, para o público de pé, cantando, acompanhando o ritmo com palmas e dançando, então o público saiu extasiado, cantando e levando pra casa um enorme encanto como quem tolhe flores num campo.

Quem “pagou pra ver” pensando que haveria repetição do azul gotejante, se surpreendeu!Cantou, dançou e se emocionou enormemente. Cada arranjo cuidadosamente trabalhado com efeitos ora de música eletrônica, ora de orquestra parecia um espaço confortável que a cada um dos músicos exibia espontaneidade em seus sorrisos e olhares, satisfação em cada gesto, movimentação e dança. Resumindo: o show é como a revelação sutil de um segredo tão seu (ou meu) de forma espontânea, descontraída e amável; A extração de um dos Meus/seus/dela Segredo Mais Sincero.

Obrigada aos amigos Rodrigo e Suzana.












TEATRO DA CAIXA

SBS QUADRA 04, LOTE ¾

ANEXO AO EDIFICIO MATRIZ DA CAIXA.

Leila Pinheiro: Meu segredo mais sincero.

Dias 23 a 25 de abril de 2010.

Ingressos à R$20 e R$10.


Sítio oficial da Leila:

http://www2.uol.com.br/leilapinheiro


(Eu e a Leila Pinheiro)



segunda-feira, 1 de março de 2010

Libellus

Depois de tanto tempo sem nos vermos, quando voltamos a nos encontrar, seremos apenas esboços do que éramos.Do que conhecíamos. Não sei, se é bom ou mal, realmente não sei. Sei apenas o que é, ou o que será.

A estreita linha da memória nos perseguirá eternamente, não creio que exista algo que seja capaz de apagar. Mas esboços podem se deteriorar, ou se perder pelas mudanças. Você diz que não e eu digo o mesmo. Engraçado. No mesmo instante telepaticamente perfeito sem planejar, sempre dá tudo certo. Até mesmo nós, nossas vicissitudes, dormencias e a distância. E a distância. De nós mesmos.

Para T.

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

Sobre a procrastinação

procrastinar -
(latim procrastino, -are)

v. tr.

1. Diferir de dia em dia ou deixar para depois. = adiar, postergar, protrairantecipar

v. intr.

2. Usar de delongas. = delongar, demorar, postergarabreviar, acelerar, despachar-se


“Quanto tempo sem escrever! Mas o tempo de descanso dessa terra deve ser respeitado. Então, espere. Tempo de plantar, tempo de colher. Complacência, humildade e resignação na medida certa. Sim, é difícil…mas, em determinada hora, ele pede pra desabrochar na tela , no papel ou no que possa se estender como memória além da essência e da carne. Pede pra fluir, preenche toda e cada célula, carrega num profundo fluxo e influxo simultâneo … o que você faz¿”

Todo o conteúdo óbvio, aparentemente simples, prático e lógico é, por demais, o contrário do que aparenta. Explico: Sabemos que fazer tarefas desgastantes o quanto antes reduz o peso aparente. Mas por que então, negligenciamos¿

A bola de neve cresce, mas diferente de gráficos, não reduz.Cada vez mais, adiamos o desagradável, e, apreendendo/aceitando as consequiencias, passamos a procrastinar, também, o que mais gostamos.

Daqui a pouco, não há mais concentração, centralização sequer ao que outrora fora “você” ou “sua vida”.

Sim!É muito óbvio, e você, claro, sabe tudo isso. Mas pergunto: E a aplicabilidade¿Certamente, será total se sua mente e coração estão tranquilos em EQUILIBRIO… mas isso é utopia, não¿Mas é esse o ponto-chave.

Agora diga:qualquer equação monstruosa, complicada e capetosa não é mais facilmente aplicável¿